Depois do banho de água fria da alta dos juros, a ala desenvolvimentista do governo deu um alento ao setor produtivo. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou na quarta-feira 5 um conjunto de medidas para estimular as exportações e se contrapor à valorização do real, potencializada pelo início de um novo ciclo de aumento da Selic.
Especialistas em política industrial e empresários ligados ao comércio exterior foram unânimes em aplaudir a criação da Agência de Crédito à Exportação – Exim Brasil –, sucessora da Finame, com maior agilidade e um leque de atuação mais amplo, hoje limitado no caso do financiamento a serviços e bens de consumo. “Um processo complexo de análise de financiamento, que hoje leva três ou quatro meses, poderá ser realizado em 30 dias sem aumento de custos”, afirmou o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, no lançamento.
O Exim Brasil será uma subsidiária integral do BNDES focado em financiar as vendas da indústria pesada, de navios a equipamentos do setor energético, em operações de longo prazo que, em geral, não interessam aos bancos privados. Caberá ao BNDES administrar o Fundo Garantidor do Comércio Exterior (FGCE), de natureza privada e, portanto, livre das regras rígidas do orçamento público. O governo anunciou ainda a criação da Empresa Brasileira de Seguros (EBS), de modo a viabilizar as operações de financiamento de prazo maiores, tanto para exportação como para os projetos de infraestrutura e as parcerias público-privadas.
O governo incluiu ainda iniciativas que devem ter deixado de cabelo em pé a turma do BC. Destaque para a criação de um mecanismo que permitirá aos produtos fabricados no País serem escolhidos nas licitações públicas com preços até 25% acima dos seus similares importados. Nos próximos meses, um estudo específico será levado adiante para definir as margens que servirão de parâmetro para itens específicos.
“A criação da EBS e da agência de financiamento são iniciativas importantes de estruturação do comércio exterior brasileiro”, diz o economista Julio Sergio Gomes de Almeida, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. “Trata-se de um pacote de medidas muito bom, mas cuja execução será decisiva. A EBS, por exemplo, é fundamental para o BNDES continuar ampliando suas operações de financiamento. E, desde que usada criteriosamente, a margem criada para os produtos brasileiros poderá ser um incentivo importante para os investimentos em infraestrutura.”
Como parte do pacote, o governo começou a mexer em um vespeiro que tira o bom humor dos exportadores há anos, a devolução dos impostos pagos na exportação. A partir da regulamentação da medida, os exportadores receberão 50% do crédito em até 30 dias, algo que hoje pode levar cinco anos. A medida, contudo, causou desconforto em setores da indústria que brigam há tempos pela devolução integral e imediata desses impostos, como prevê a legislação. Um diretor da Fiesp ameaçou entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade, mas a Federação das Indústrias voltou atrás e, em nota oficial, elogiou as medidas anunciadas, afirmando que vários itens do pacote foram sugeridos pela própria entidade.
O governo reconhece que, neste caso, a demanda do empresariado é legítima. “Sabemos que a medida anunciada não é a solução definitiva e vamos continuar trabalhando nesse sentido. Mas é um passo para devolver esses créditos com maior rapidez. E os 50% do crédito devido muitas vezes representa tudo o que o exportador tem de fato a receber, já que a outra metade ele pode usar para pagar impostos”, afirma Nelson Barbosa, secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.
Barbosa admite que as medidas anunciadas terão efeito no médio prazo, ou seja, serão incapazes de reverter a deterioração do saldo comercial – e das contas externas do País em sentido amplo – em 2010 e 2011. Nesse período, o decisivo será mesmo o patamar da taxa de câmbio e o apetite comprador do mercado internacional, ainda bem abaixo do nível anterior à crise internacional iniciada em setembro de 2008. Esse problema, admite o secretário, fica para depois. “Nos preocupamos com o déficit em conta corrente, mas temos altas reservas internacionais e a taxa de câmbio acabará se ajustando à medida que o déficit externo aumentar.”
Nesse contexto, contar com os dólares das exportações não é recomendável – muito menos no caso das vendas industriais, segmento em que a economia nacional patina há décadas e que registra déficit desde 2008. No primeiro trimestre de 2010, o déficit comercial da indústria de transformação chegou a 7,1 bilhões de dólares, 4,5 bilhões maior do que o registrado no mesmo período do ano passado.
Entre os segmentos industriais, o setor de autopeças aparece como o principal responsável pelo resultado ruim da balança comercial. A expectativa é que tenha ao longo do ano um saldo negativo de 3 bilhões de dólares. Justamente por isso o governo incluiu no pacote o fim do desconto de 40% do imposto de importação para as autopeças.
Hipocrisia eleitoreira A Câmara aprova 7,7% aos aposentados e o fim do fator previdenciário
Na terça-feira 4, a Câmara aprovou um reajuste de 7,7% para os aposentados que ganham mais de um salário mínimo e o fim do fator previdenciário, que retarda as aposentadorias precoces. O resultado da votação representa grande dor de cabeça para o governo, que havia editado uma medida provisória, em vigor desde janeiro, fixando um aumento de 6,14% nas aposentadorias.
Líder do governo na Câmara, o deputado Cândido Vaccarezza ficou isolado na defesa de um reajuste de até 7%, o teto máximo que o governo considera “aceitável”. De olho nas eleições, tanto parlamentares de partidos da oposição como os da bancada governista votaram a favor do reajuste maior. O próprio PT liberou seus deputados para votar como bem entendessem.
Pelos cálculos de Vaccarezza, a decisão acarretará num rombo de 15 bilhões de reais nas contas da Previdência em 2010. Agora, os governistas têm a tarefa de tentar modificar a medida provisória no Senado. Caso o texto seja aprovado como está, caberá a Lula o ônus de vetar o reajuste maior, como antecipou o ministro Paulo Bernardo, pouco antes da votação na Câmara. – Rodrigo Martins
Fonte: Carta Capital - http://www.cartacapital.com.br/app/materia.jsp?a=2&a2=7&i=6735
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