domingo, 30 de maio de 2010

Crescimento Econômico x Inflação



29/05/2010 12h18 - Atualizado em 29/05/2010 15h58

Governo quer desaquecer economia para evitar inflação; entenda

Alta dos preços deve terminar 2010 acima do centro da meta.
Corte dos gastos do governo diminuiria necessidade de subir juros.

Ligia Guimarães
Do G1, em São Paulo

Se a economia retraída é ruim para um país, o crescimento excessivo também pode ser um problema. No Brasil, governo e economistas temem que a boa fase econômica de alta do consumo e do crédito somada a baixos níveis de desemprego gere um "efeito colateral" muito conhecido e nada desejado pelos brasileiros: a inflação.
Se o governo retira a parte dos gastos dele, precisa subir menos os juros"
Carlos Eduardo Gonçalves, da USP
Para combater a alta dos preços, o governo usa dois “remédios” principais: os juros, que o Banco Central eleva para frear a economia, e o controle dos gastos públicos, que incluem investimentos, programas sociais, estímulos fiscais e salários do funcionalismo público.

G1 ouviu especialistas e explica, passo a passo, como boas notícias para a economia podem afetar os preços e o bolso do consumidor. Confira:

Mais inflação que o esperado
Para 2010, o mercado prevê que a inflação oficial medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), feche o ano em 5,67%. O número é maior do que a meta central de 4,5% estipulada pelo governo, com um intervalo de tolerância de dois pontos, para mais ou para menos.

Gráfico IPCA, inflação medida pelo IBGEGráfico mostra a trajetória da inflação oficial (Foto: Editoria de Arte / G1)
"Há certo exagero, uma histeria. Não é nenhuma tragédia se a inflação ficar em até 6,5%"
Roberto Piscitelli, da UNB
Daí a preocupação: será que há o risco de o Brasil voltar aos tempos de inflação descontrolada e remarcação diária de preços? Não, na avaliação do professor da UNB, Roberto Piscitelli.

“Não vamos ficar no centro da meta (de 4,5%), mas há certo exagero, uma histeria. Parece que quando a gente fica acima do centro da meta a política monetária fracassou, e não é assim. Não é nenhuma tragédia se a  inflação ficar em até 6,5%, estamos dentro da meta”, afirma Piscitelli.

O economista Carlos Eduardo Gonçalves, professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da USP, concorda. "A inflação vai fechar (o ano) entre 5% e 5,5%, o BC precisa fazer ela descer um pouquinho, nada exagerado, para 4,6% mais ou menos. O BC está mexendo nos juros para alcançar esse objetivo", disse.
Recentemente o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o Brasil pode crescer até 6% este ano sem que a inflação saia do controle. "Como a atividade está aquecida, é normal [que a inflação] que seja superior à do ano passado".
Na opinião de Piscitelli, da UNB, 6% é um patamar razoável de crescimento sem descontrole dos preços.
"A gente tem que ver que esse crescimento é comparado a 2009, que foi um ano de estagnação; qualquer crescimento é significativo. Uma taxa de 5% eu não acho que seria tão baixa. Não quero a taxa da China, não parece muito humana ambientalmente e do ponto de vista das relações de trabalho", diz.
De olho nos gastos públicos
Quando o governo investe em obras, aumenta o salário de funcionários ou isenta alguns setores de impostos, ele está fazendo compras e gerando demanda: paga serviços, mão-de-obra e aumenta a renda dos trabalhadores, fazendo com que mais pessoas consumam e, consequentemente, que a indústria produza mais.
Em alguns momentos, acelerar as despesas públicas é importante: foi o que o governo fez para estimular crescimento no mercado interno brasileiro durante a crise, por exemplo, e que garantiu retração de 0,2% em 2009 - considerada "leve" comparada ao desempenho depaíses desenvolvidos.
A inflação aumenta quando há desequilíbrio: a demanda por produtos cresce em ritmo maior do que a indústria consegue produzir para atender tanto consumo.
"O governo reduzir gastos significa menos crescimento da demanda e menos pressão inflacionária", diz o economista da PUC-RJ José Márcio Camargo. Este mês, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou corte de cerca de R$ 10 bilhões nos gastos de custeio dos ministérios neste ano.
Para economistas, a medida sinaliza o caminho certo para a gestão da economia.
"Se o governo retira a parte dos gastos dele e para de comprar, ele diminui a pressão sobre os fatores de produção e abre mais espaço para os gastos do setor privado. Precisa elevar menos os juros", explica Carlos Eduardo Gonçalves, da USP.
Desde o início deste ano, o governo brasileiro vem retirando progressivamente os estímulos concedidos durante a crise financeira. O Banco Central já reverteu boa parte dos R$ 100 bilhões liberados em depósitos compulsórios (que têm de ser mantidos na autoridade monetária), além de ter começado a subir os juros.
Ao mesmo tempo, o Ministério da Fazenda determinou o fim da redução do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) para a compra de automóveis, e da linha branca (fogões, geladeiras, máquinas de lavar e tanquinho), enquanto o Ministério do Planejamento anunciou cortes totais de mais de R$ 30 bilhões no orçamento dos ministérios em 2010.
Elevando os juros
No Brasil, a principal ferramenta usada pelo Banco Central para controlar a inflação são os juros. Quando eles são elevados, entende-se que as pessoas gastam menos porque o custo do dinheiro fica maior - o que desestimula a demanda e a inflação.

Em abril, o Comitê de Política Monetária, do BC, subiu a taxa de juros básica da economia, a Selic, pela primeira vez em 19 meses. A última subida havia ocorrido em setembro de 2008, poucos dias antes do anúncio de concordata do banco norte-americano Lehman Brothers, que deu início à fase mais aguda da crise financeira internacional.
Selic AbrilGráfico mostra a trajetória dos juros no Brasil desde 2006. (Foto: Editoria de arte G1)
"Quando o Banco Central sobe os juros ele força uma redução nos gastos do setor privado. Se o governo decide diminuir o gasto dele, o BC não precisa subir tanto o juros porque não precisa reduzir tando os gastos do setor privado para conter a inflação",  diz Gonçalves.
Há ainda um dilema considerado na condução da política monetária: se os juros são elevados para conter a inflação no curto prazo, podem atrapalhar os investimentos de empresários da indústria e reduzir a capacidade produtiva no futuro. Para Piscitelli, da UNB, a intenção do BC de elevar juros por muito tempo é exagerada e pode trazer prejuízos desnecessários à economia.
"Daqui a pouco a taxa de juros vai causar risco de inflação no longo prazo. Se nesse momento eu aumento taxa de juros eu posso até inibir investimentos e causar inflação lá na frente por escassez de produtos", afirma o economista.

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