O momento no mercado de algodão é de recessão: os efeitos são sentidos no comércio e na indústria têxtil. É nesse clima que começou nesta quarta-feira (24/03), a trigésima Conferência Internacional de Algodão, em Bremen, na Alemanha. Representantes de 40 países se reúnem num momento propício para fazer um balanço: esta é a primeira edição da conferência desde o começo da crise financeira.
Realizado pela primeira vez em 1957, o fórum tinha então um caráter meramente científico e era usado para discutir novas técnicas para a avaliação e processamento da valiosa matéria-prima. Mas, com o passar dos anos, o encontro bienal se transformou em evento-chave para os importadores e exportadores de algodão, assim como para os produtores e consumidores da fibra que deriva do produto.
Presença brasileira
O Brasil é o único país da América Latina a participar da conferência: com uma produção de 500 milhões de toneladas em 2009, o país é atualmente o exportador mais importante da região.
Jan Wellmann, diretor da Bolsa de Algodão de Bremen, fundada em 1872, explica a ausência dos outros países latino-americanos, como, por exemplo, o Peru, onde a colheita de algodão é milenar e o solo é um dos poucos que permite o cultivo da planta o ano todo.
"O Peru já não tem importância neste âmbito", explica Wellmann. "O que é produzido nos países latino-americanos é consumido por seus respectivos mercados internos. O Brasil se distanciou de seus vizinhos no começo deste milênio."
Na análise de Wellmann, o Paraguai é um exportador digno de ser mencionado, no entanto, a produção deste país é muito menor do que a brasileira, assinala. "A Argentina consome quase toda a matéria-prima que produz e importa algodão do Brasil. Por isso o interesse segue em torno do gigante da América do Sul", acrescenta Wellmann.
Bildunterschrift: Fazenda de algodão em Ituverava (MG)
Alemanha e os gigantes
"Infelizmente, o futuro próximo da Alemanha como processador de algodão não parece nada promissor", sustenta Wellmann. Segundo ele, o processamento de algodão no país tem caído de maneira contínua, como no resto da Europa.
"As instâncias que se encarregam disso no nosso continente têm sido substituídas por outras diretamente nos países que cultivam o algodão, a Índia e a China, que são grandes produtores e consumidores de algodão", analisa.
Assuntos do dia
Os avanços tecnológicos também estão em pauta na conferência, além de assuntos que preocupam a opinião pública. "Sobre o tópico algodão orgânico e transgênico se discute muito atualmente, em parte devido ao escândalo em torno do algodão indiano que recebeu uma falsa certificação", comenta Wellmann.
A planta transgênica, naturalmente, também terá lugar na discussão: "Setenta por cento do algodão produzido no mundo é fruto de engenharia genética, em alguns países a proporção de algodão transgênico chega a 90%. Mas isso é estigmatizado na Europa, onde essa matéria-prima é descrita como 'contaminada geneticamente'", conta o diretor da Bolsa de Algodão de Bremen.
Segundo Wellmann, é tarefa dos participantes usarem a ciência para responder questões sobre benefícios e efeitos prejudiciais do algodão transgênico. "O mesmo ocorre com o debate em torno da quantidade de água usada para produzir uma camiseta e a polêmica dos subsídios", explica Wellmann, que ressalta o esforço da instituição para fugir de assuntos estritamente científicos e se aproximar da discussão pública.
Algodão subsidiado
A questão dos subsídios agrícolas será analisada mais de perto, já que o assunto é importante para os 80 países produtores de algodão no mundo. "Este é um problema para os países mais pobres porque o algodão produzido nestes lugares não pode competir no mercado com os produtores subsidiados, como acontece nos Estados Unidos e na Austrália", ressalta Wellmann.
Na safra 2008/2009, o governo norte-americano concedeu 3 bilhões de dólares em subsídios aos seus 25 mil produtores de algodão. Sem o recurso, os fazendeiros não conseguiriam oferecer preços competitivos no mercado internacional.
Contra essa política, o Brasil reclamou em 2004 na Organização Mundial do Comércio e ganhou a briga, mas pouco aconteceu até agora. Os EUA mudaram alguns detalhes, mas os subsídios continuam.
Brasil pressiona EUA
Em represália, e com a aprovação da OMC, o governo brasileiro decidiu elevar, a partir de abril próximo, as taxas de importação sobre mais de 100 produtos dos Estados Unidos.
Gary Adams, do Conselho Nacional do Algodão dos EUA, se defende: "O preço atual do algodão é 50% mais alto do que um ano atrás. Os Estados Unidos reduziram drasticamente a produção, enquanto Brasil, Índia e China produzem muito mais. Por isso, o passo que o Brasil está dando é, do nosso ponto de vista, infeliz".
Roberto Azevedo, embaixador brasileiro na OMC que acompanhou o debate entre os dois países, salienta: "Eles disseram publicamente que ficaram surpresos com a medida. Mas eu posso dizer que nós também ficamos surpresos. Precisamos fazer isso porque não nos foram apresentadas alternativas aceitáveis", finaliza.
Segundo a ONG Oxfam, o fim das subvenções ao algodão norte-americano significaria um aumento de até 14% no preço mundial do algodão, o que beneficiaria, acima de tudo, os produtores na África.
Autores: E. Romero-Castillo/ A. Kriesch / N. Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer
http://www.dw-world.de/dw/article/0,,5384539,00.html?maca=bra-uol-eco-1394-xml-uol
Nenhum comentário:
Postar um comentário