domingo, 18 de abril de 2010

Brasil - novos cenários da economia


Cresce a preocupação com alimentação saudável e com ela os negócios do setor

Empreendimentos que quiserem apostar na tendência devem ter em mente os preconceitos que ainda existem contra a “comida de coelho”

Por Ricardo F. Santos
iStockphoto.com
A atual preocupação com alimentação saudável tem suas raízes algumas décadas atrás, quando surgiram os alimentos diet. Dênis Ribeiro, diretor de economia da Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (ABIA), conta que a difusão de informações nutricionais, cadernos de saúde e relacionamento direto entre alimentação e bem-estar fizeram surgir essa preocupação. “Os alimentos diet, inicialmente, eram direcionados a diabéticos e não tinham açúcar. Depois, evoluíram para um sentido de prevenção, a fim de evitar problemas de saúde no futuro”. 

A partir daí vieram os alimentos light, com menos calorias; os fortificados, com mais vitaminas, ferro, ômega-3 etc.; e os funcionais, que contribuem para a manutenção da saúde de diversas maneiras, reduzem colesterol, ativam funções intestinais e outros benefícios. “Só que para fazer uma alegação dessas publicamente, você precisa prová-la cientificamente perante a Anvisa, o que leva mais de ano”, afirma Ribeiro. 

Lívia Barbosa, diretora do Centro de Altos Estudos de Propaganda e Marketing da Escola Superior de Propaganda e Marketing (CAEPM-ESPM), acrescenta dois outros fatores que contribuíram para aumentar a preocupação com alimentação saudável. “Há um aumento global de doenças cardiovasculares e de obesidade, sejam ligadas ao sedentarismo ou à alimentação, e o envelhecimento da população; cada vez mais interessa às pessoas viver melhor”, afirma. Ela ressalta a centralidade que os temas saúde e comida assumiram na sociedade contemporânea. 
“Acho que é uma evolução natural: você começa a comer mais fora de casa, se houver apenas comida não saudável as pessoas começam a engordar”, diz Luís Yamanishi, diretor da Rede Viva! de alimentação saudável. Ainda de acordo com pesquisa da ECD Food Service, cerca de 83% dos brasileiros almoçam na rua. Em 1988, esse público gastava 19,7% de sua despesa total com alimentação fora de casa. Em 2010, esse índice deve ficar em torno de 27%. “As pessoas querem se sentir bem com uma comida que traga benefícios para a saúde; é uma alimentação preventiva”, afirma ele. A rede Viva! investe em um cardápio com muitas opções de saladas com temperos especiais, wraps, bebidas feitas com frutas frescas e outras combinações leves. Tudo para agradar a esse público.
Outra rede que segue a tendência saudável é a Wraps. A franquia se inspirou nos enroladinhos americanos, por sua vez importados dos burritos mexicanos, para criar lanches e refeições mais saudáveis. “Desenvolvemos wraps com ingredientes leves e sofisticados, como filé mignon, peixe, queijos light e folhas verdes”, explica Marcelo Ferraz, proprietário da rede. Depois de alguns anos, ele percebeu existir uma demanda por comida saudável mais rápida, fast food saudável. Em 2009, estava criada a Go Fresh, em que o cliente monta a própria salada, e adiciona um pão integral e um grelhado. 

A presença do grelhado é importante, segundo ele, para as pessoas não ficarem com a sensação de que comida saudável não alimenta. “Há um preconceito muito presente, principalmente masculino, de que folha não enche barriga”, diz Lívia Barbosa, da CAEPM-ESPM. Segundo ela, faz parte da cultura a sensação de que comida deve pesar no estômago, e não apenas alimentar com os nutrientes necessários. “Você não vai resolver isso oferecendo palitinhos de cenoura na hora do lanche. O brasileiro, em geral, considera indispensável a presença da carne”, afirma ela. A mudança deve ser gradual. 

Por conta dessa mentalidade é que a alimentação saudável ainda não cresceu tanto. “Se eu tivesse dinheiro para abrir cem lojas hoje, eu não o faria, porque esse mercado ainda não está muito amadurecido”, diz Marcelo Ferraz, da Wraps. De fato, na indústria de alimentação em 2008, os alimentos diet/light, fortificados e funcionais representaram apenas 8% das vendas, somando R$ 21,8 bilhões, segundo Ribeiro, da ABIA. “A pouca participação desses produtos é um problema de evolução de mercado. À medida que a população se informa mais sobre alimentos saudáveis, o mercado amadurece: o consumidor fica mais exigente e as empresas ficam mais competitivas, melhorando seu produto. Tem bastante espaço para crescer”, afirma ele. 

Outro preconceito muito latente é de que o saudável não é gostoso. “Isso é porque geralmente se associa alimento saudável à comida macrobiótica, que propõe o mínimo de intervenção no alimento e procura servir a maioria das coisas ao natural”, diz Lívia. As redes de alimentação também têm essa consciência e investem na variedade. A Salad Creations, por exemplo, diversifica os ingredientes para provar que comida saudável vai além de comer alface e cenoura. A rede foi fundada em 2004 na Flórida, nos Estados Unidos, e veio para o Brasil em 2007 com lojas em São Paulo e no Rio de Janeiro. Seu grande diferencial é oferecer mais de 40 ingredientes e diferentes molhos para o cliente montar a própria salada. Prova de que a iniciativa deu certo é o faturamento da empresa, que cresce em média 30% ao ano. A rede já possui 13 lojas no Brasil, pretende abrir mais 14 em 2010 e chegar a 50 no fim de 2011. 

Não é apenas com saladas que se pode ser saudável; outro alimento de consumo crescente é o frozen yogurt. Ele é comparável ao sorvete, mas tem metade das calorias e muito menos gordura. Nos Estados Unidos, onde faz mais sucesso, representa 30% do mercado de congelados, e seu consumo cresce mais do que o do sorvete comum. Duas grandes redes que trabalham com o produto aqui no Brasil são a Yogoberry e a Yoguland

A Yogoberry foi fundada no final de 2007, e menos de três anos depois já possui 26 unidades abertas na região Sudeste e no Distrito Federal. O faturamento da rede cresceu 30% de 2008 para 2009, chegando a R$ 2 milhões. A Yoguland, que atua no mesmo nicho, fundada há menos de um ano, já está com seis unidades abertas na região Sul e em São Paulo, faturando em média R$ 80 mil cada loja. Ambas estão se expandindo por meio de franquias e apostam no amadurecimento do consumidor, que procura cada vez mais alternativas saudáveis na hora de se alimentar. 

O público da alimentação saudável ainda é predominantemente feminino, afirmam Rafael Soares, proprietário da Yoguland, e Marcelo Ferraz, da Wraps. Os restaurantes de comida saudável querem passar a mensagem, principalmente aos homens, de que uma refeição em seus estabelecimentos equivale a uma refeição completa. “Hoje a diferença entre homens e mulheres no nosso público é menor do que quando começamos; tentamos passar aos homens, em geral mais glutões, a mensagem de que comida saudável não deixa com fome”, afirma Ferraz. 

Não é porque existe essa tendência saudável que você deve parar tudo o que faz no seu restaurante e começar a vender alface; é só ter em mente a importância crescente que o consumidor atribui à saúde na alimentação. E não é preciso vender apenas alimentos saudáveis, há várias franquias apenas tornando seu cardápio mais leve. Só não pode ficar parado, porque essa tendência vai crescer por décadas.

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