Claudia Andrade
Do UOL Notícias
Em Brasília
29/10/2009 - 14h30
A Venezuela ficou mais perto de ser admitida no Mercosul nesta quinta-feira (29), dia em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajará a Caracas para encontros com o presidente Hugo Chávez. A CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional) aprovou o protocolo de adesão assinado em Caracas em julho de 2006 e encaminhado pelo Executivo ao Congresso no início de 2007. A matéria ainda precisa ser votada no plenário do Senado, o que deverá ocorrer na próxima semana.
A questão da entrada da Venezuela no bloco econômico fará parte das conversas entre Lula e Chávez, de acordo com informação do porta-voz da Presidência da República. Na quarta-feira, Marcelo Baumbach disse ainda que o presidente brasileiro estava "confiante" na aprovação do protocolo tanto na CRE como no plenário.
A primeira etapa foi superada nesta quinta, com a aprovação do protocolo por 12 votos a 5. Os senadores acataram um voto em separado apresentado pelo líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), depois que o relatório do tucano Tasso Jereissati (CE), contrário à adesão, foi rejeitado.
O parecer de Jereissati dizia que o presidente Chávez "tem demonstrado pouca consideração a acordos e contratos" e que, por isso, o governo brasileiro poderia enfrentar situações "difíceis e complicadas" no futuro. O texto foi rejeitado com 11 votos 'não', três votos 'sim' e uma abstenção.
No início desta semana, contudo, o senador admitiu que poderia mudar sua posição, caso o governo Hugo Chávez se comprometesse a respeitar a democracia. A possibilidade de acordo foi levantada durante audiência pública em que o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, criticou as restrições à liberdade em seu país, mas defendeu a entrada da Venezuela no bloco, com ressalvas.
À essa altura, governistas já se mobilizavam pela aprovação do protocolo. O voto paralelo de Jucá tinha o apoio de vários integrantes da base, mas alguns ainda se manifestavam contrários à aprovação, como Fernando Collor (PTB-AL). Um dos maiores críticos à adesão da Venezuela, o senador não compareceu à reunião desta quinta.
Em seu parecer, Jucá argumentou que um veto à entrada da Venezuela no Mercosul "representaria um ato de hostilidade do Estado brasileiro contra um país amigo". Afirmou ainda que um veto iria contra a Constituição brasileira, no que se refere à construção do espaço latino-americano de integração e "acarretaria graves consequências para os interesses comerciais, industriais, políticos e estratégicos" do Brasil no bloco econômico.
Jucá ressaltou ainda os prejuízos econômicos da rejeição do protocolo. Segundo o relatório, não aprovar a adesão venezuelana corresponderia a incentivar o sexto maior cliente mundial do Brasil a procurar outros parceiros. "As primeiras vítimas serão nossas exportações, hoje da ordem de US$ 5 bilhões (...) além dos nossos contratos, hoje da ordem de US$ 15 bilhões", afirma o texto.
A mensagem do governo sobre o protocolo também destaca os números que a Venezuela acrescentaria ao Mercado Comum do Sul, que passaria a constituir um bloco com mais de 250 milhões de habitantes, área de 12,7 milhões de km2, PIB (produto interno bruto) superior a US$ 1 trilhão - montante equivalente a cerca de 76% do PIB da América do Sul - e comércio global superior a US$ 300 bilhões.
Jereissati ainda defendeu a não entrada da Venezuela no Mercosul, dizendo que aquele país tem ficado contra os interesses do Brasil em assuntos da região, como durante a crise do gás com a Bolívia. Ressaltou ainda a violação da democracia no país vizinho, com prisão de jornalistas, como fato que contribuiria para a não aceitação.
No início desta semana, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), reiterou sua posição contrária à adesão venezuelana, por considerar que ela quebra a cláusula democrática do Mercosul.
Estabelecida por meio do protocolo de Ushuaia, assinado em 1998, a cláusula estabelece "a plena vigência das instituições democráticas" como condição "essencial" para o desenvolvimento do processo de integração entre os Estados parte.
O protocolo de Ushuaia foi citado em voto paralelo apresentado pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) que condicionava a aprovação à adequação venezuelana aos princípios do Mercosul. "Ficamos entre aquela música da novela recente que diz 'você não vale nada, mas eu gosto de você' ou a música do Chico Buarque que diz 'apesar de você, amanhã há de ser outro dia'. Por isso eu voto pela aprovação, mas com ressalvas", defendeu.
Contudo, seu relatório foi rejeitado, assim como o de Jereissati, para aprovação do parecer de Romero Jucá. Na Câmara dos Deputados, o protocolo foi aprovado em dezembro do ano passado, tendo como único partido contrário o PSDB. Outros dois países do Mercosul já aprovaram a entrada da Venezuela no bloco: Uruguai e Argentina. O Paraguai ainda analisa a questão.
Se for aceita por todos os integrantes do bloco, a Venezuela terá de adotar a tarifa externa comum sobre os produtos comercializados. Também terá de aceitar as condições de negociações com países de fora do Mercosul.
Viagem negada
A reunião da CRE começou com um debate acirrado sobre requerimento apresentado pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) para que um grupo de parlamentares fizesse uma viagem a Caracas. Na viagem, seriam averiguadas denúncias de violações aos direitos humanos.
"Uma coisa é discutir o ingresso da Venezuela no Mercosul, outra coisa é saber se tem preso político, gerar toda uma mídia interna em torno disso. Entraremos na briga", afirmou Jucá.
Jereissati manifestou-se a favor da viagem, dizendo que não era possível considerar "irrelevante" uma viagem para "ver o que acontece na Venezuela".
O peemedebista Pedro Simon (RS) disse que a visita deveria ser feita depois da aprovação da entrada da Venezuela no Mercosul, uma vez que a viagem "não traria novidades". "Eu acredito que quase tudo o que o prefeito de Caracas disse aqui é verdade".
O requerimento foi rejeitado com placar de 10 votos a 8.
O que está em jogo com a entrada da Venezuela
Setores contrários à entrada da Venezuela no Mercosul afirmam que o governo do presidente Hugo Chávez deixa a desejar em relação ao respeito aos princípios democráticos e que a adesão de seu país pode ser prejudicial ao bloco.
De acordo com analistas consultados pela BBC Brasil, o estilo "personalista" de Chávez pode ser motivo de temor em alguns países da região
No entanto, o argumento dos defensores do ingresso da Venezuela no Mercosul é o de que não se pode impedir a entrada do povo venezuelano no bloco devido à atual circunstância política e que deixar o governo Chávez isolado seria pior.
"O problema não é a Venezuela, todo mundo quer que a Venezuela faça parte do Mercosul. O problema é o governo Chávez", diz Georges Landau, conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri)
Do UOL Notícias
Em Brasília
29/10/2009 - 14h30
A Venezuela ficou mais perto de ser admitida no Mercosul nesta quinta-feira (29), dia em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajará a Caracas para encontros com o presidente Hugo Chávez. A CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional) aprovou o protocolo de adesão assinado em Caracas em julho de 2006 e encaminhado pelo Executivo ao Congresso no início de 2007. A matéria ainda precisa ser votada no plenário do Senado, o que deverá ocorrer na próxima semana.
A questão da entrada da Venezuela no bloco econômico fará parte das conversas entre Lula e Chávez, de acordo com informação do porta-voz da Presidência da República. Na quarta-feira, Marcelo Baumbach disse ainda que o presidente brasileiro estava "confiante" na aprovação do protocolo tanto na CRE como no plenário.
A primeira etapa foi superada nesta quinta, com a aprovação do protocolo por 12 votos a 5. Os senadores acataram um voto em separado apresentado pelo líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), depois que o relatório do tucano Tasso Jereissati (CE), contrário à adesão, foi rejeitado.
O parecer de Jereissati dizia que o presidente Chávez "tem demonstrado pouca consideração a acordos e contratos" e que, por isso, o governo brasileiro poderia enfrentar situações "difíceis e complicadas" no futuro. O texto foi rejeitado com 11 votos 'não', três votos 'sim' e uma abstenção.
No início desta semana, contudo, o senador admitiu que poderia mudar sua posição, caso o governo Hugo Chávez se comprometesse a respeitar a democracia. A possibilidade de acordo foi levantada durante audiência pública em que o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, criticou as restrições à liberdade em seu país, mas defendeu a entrada da Venezuela no bloco, com ressalvas.
À essa altura, governistas já se mobilizavam pela aprovação do protocolo. O voto paralelo de Jucá tinha o apoio de vários integrantes da base, mas alguns ainda se manifestavam contrários à aprovação, como Fernando Collor (PTB-AL). Um dos maiores críticos à adesão da Venezuela, o senador não compareceu à reunião desta quinta.
Em seu parecer, Jucá argumentou que um veto à entrada da Venezuela no Mercosul "representaria um ato de hostilidade do Estado brasileiro contra um país amigo". Afirmou ainda que um veto iria contra a Constituição brasileira, no que se refere à construção do espaço latino-americano de integração e "acarretaria graves consequências para os interesses comerciais, industriais, políticos e estratégicos" do Brasil no bloco econômico.
Jucá ressaltou ainda os prejuízos econômicos da rejeição do protocolo. Segundo o relatório, não aprovar a adesão venezuelana corresponderia a incentivar o sexto maior cliente mundial do Brasil a procurar outros parceiros. "As primeiras vítimas serão nossas exportações, hoje da ordem de US$ 5 bilhões (...) além dos nossos contratos, hoje da ordem de US$ 15 bilhões", afirma o texto.
A mensagem do governo sobre o protocolo também destaca os números que a Venezuela acrescentaria ao Mercado Comum do Sul, que passaria a constituir um bloco com mais de 250 milhões de habitantes, área de 12,7 milhões de km2, PIB (produto interno bruto) superior a US$ 1 trilhão - montante equivalente a cerca de 76% do PIB da América do Sul - e comércio global superior a US$ 300 bilhões.
Jereissati ainda defendeu a não entrada da Venezuela no Mercosul, dizendo que aquele país tem ficado contra os interesses do Brasil em assuntos da região, como durante a crise do gás com a Bolívia. Ressaltou ainda a violação da democracia no país vizinho, com prisão de jornalistas, como fato que contribuiria para a não aceitação.
No início desta semana, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), reiterou sua posição contrária à adesão venezuelana, por considerar que ela quebra a cláusula democrática do Mercosul.
Estabelecida por meio do protocolo de Ushuaia, assinado em 1998, a cláusula estabelece "a plena vigência das instituições democráticas" como condição "essencial" para o desenvolvimento do processo de integração entre os Estados parte.
O protocolo de Ushuaia foi citado em voto paralelo apresentado pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) que condicionava a aprovação à adequação venezuelana aos princípios do Mercosul. "Ficamos entre aquela música da novela recente que diz 'você não vale nada, mas eu gosto de você' ou a música do Chico Buarque que diz 'apesar de você, amanhã há de ser outro dia'. Por isso eu voto pela aprovação, mas com ressalvas", defendeu.
Contudo, seu relatório foi rejeitado, assim como o de Jereissati, para aprovação do parecer de Romero Jucá. Na Câmara dos Deputados, o protocolo foi aprovado em dezembro do ano passado, tendo como único partido contrário o PSDB. Outros dois países do Mercosul já aprovaram a entrada da Venezuela no bloco: Uruguai e Argentina. O Paraguai ainda analisa a questão.
Se for aceita por todos os integrantes do bloco, a Venezuela terá de adotar a tarifa externa comum sobre os produtos comercializados. Também terá de aceitar as condições de negociações com países de fora do Mercosul.
Viagem negada
A reunião da CRE começou com um debate acirrado sobre requerimento apresentado pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) para que um grupo de parlamentares fizesse uma viagem a Caracas. Na viagem, seriam averiguadas denúncias de violações aos direitos humanos.
"Uma coisa é discutir o ingresso da Venezuela no Mercosul, outra coisa é saber se tem preso político, gerar toda uma mídia interna em torno disso. Entraremos na briga", afirmou Jucá.
Jereissati manifestou-se a favor da viagem, dizendo que não era possível considerar "irrelevante" uma viagem para "ver o que acontece na Venezuela".
O peemedebista Pedro Simon (RS) disse que a visita deveria ser feita depois da aprovação da entrada da Venezuela no Mercosul, uma vez que a viagem "não traria novidades". "Eu acredito que quase tudo o que o prefeito de Caracas disse aqui é verdade".
O requerimento foi rejeitado com placar de 10 votos a 8.
O que está em jogo com a entrada da Venezuela
Setores contrários à entrada da Venezuela no Mercosul afirmam que o governo do presidente Hugo Chávez deixa a desejar em relação ao respeito aos princípios democráticos e que a adesão de seu país pode ser prejudicial ao bloco.
De acordo com analistas consultados pela BBC Brasil, o estilo "personalista" de Chávez pode ser motivo de temor em alguns países da região
No entanto, o argumento dos defensores do ingresso da Venezuela no Mercosul é o de que não se pode impedir a entrada do povo venezuelano no bloco devido à atual circunstância política e que deixar o governo Chávez isolado seria pior.
"O problema não é a Venezuela, todo mundo quer que a Venezuela faça parte do Mercosul. O problema é o governo Chávez", diz Georges Landau, conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri)
Fonte: UOL Noticias.
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