Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, o que está ocorrendo agora é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que alimentou a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o "impulso" que a economia precisava. O artigo é de Paul Krugman.
Paul Krugman é professor de Economia em Princeton e Prêmio Nobel 2008.
Tradução: Katarina Peixoto
Somente podemos esperar que os políticos em Washington e Bruxelas consigam driblar essas ameaças. Mas há um problema: ainda que consigamos evitar uma catástrofe imediata, os acordos que vêm sendo firmados dos dois lados do Atlântico vão piorar a crise econômica com quase toda certeza.
De fato, os responsáveis políticos parecem decididos a perpetuar o que está sendo chamado de Depressão Menor, o prolongado período de desemprego elevado que começou com a Grande Recessão de 2007-2009 e que continua até o dia de hoje, mais de dois anos depois de que a recessão, supostamente, chegou ao fim.
Falemos um momento sobre por que nossas economias estão (ainda) tão deprimidas. A grande bolha imobiliária da década passada, que foi um fenômeno tanto estadunidense quanto europeu, esteve acompanhada por um enorme aumento da dívida familiar. Quando a bolha estourou, a construção de residências desabou, assim como o gasto dos consumidores na medida em que as famílias sobrecarregadas de dívidas faziam cortes.
Ainda assim, tudo poderia ter ido bem se outros importantes atores econômicos tivessem aumentado seu gasto e preenchido o buraco deixado pela crise imobiliária e pelo retrocesso no consumo. Mas ninguém fez isso. As empresas que dispõem de capital não viram motivos para investi-lo em um momento no qual a demanda dos consumidores estava em queda.
Os governos tampouco fizeram muito para ajudar. Alguns deles – os dos países mais débeis da Europa e os governos estaduais e locais dos EUA – viram-se obrigados a cortar drasticamente os gastos diante da queda da receita. E os comedidos esforços dos governos mais fortes – incluindo aí o plano de estímulo de Obama – apenas conseguiram, no melhor dos casos, compensar essa austeridade forçada.
De modo que temos hoje economias deprimidas. O que propõem fazer a respeito os responsáveis políticos? Menos que nada. A desaparição do desemprego da retórica política da elite e sua substituição pelo pânico do déficit tem verdadeiramente chamado a atenção. Não é uma resposta à opinião pública. Em uma sondagem recente da CBS News/The New York Times, 53% dos cidadãos mencionava a economia e o emprego como os problemas mais importantes que enfrentamos, enquanto que somente 7% mencionava o déficit. Tampouco é uma resposta à pressão do mercado. As taxas de juro da dívida dos EUA seguem perto de seus mínimos históricos.
Mas as conversações em Washington e Bruxelas só tratam de corte de gastos públicos (e talvez de alta de impostos, ou seja, revisões). Isso é claramente certo no caso das diversas propostas que estão sendo cogitadas para resolver a crise do teto da dívida nos EUA. Mas é basicamente igual ao que ocorre na Europa.
Na quinta-feira, os “chefes de Estado e de Governo da zona euro e as instituições da UE” – esta expressão, por si só, dá uma ideia da confusão que se tornou o sistema de governo europeu – publicaram sua grande declaração. Não era tranquilizadora. Para começar, é difícil acreditar que a complexa engenharia financeira que a declaração propõe possa realmente resolver a crise grega, para não falar da crise europeia em geral.
Mas mesmo que pudesse, o que ocorreria depois? A declaração pede drásticas reduções do déficit “em todos os países salvo naqueles com um programa” que deve entrar em vigor “antes de 2013 o mais tardar”. Dado que esses países “com um programa” se veem obrigados a observar uma estrita austeridade fiscal, isso equivale a um plano para que toda a Europa reduza drasticamente o gasto ao mesmo tempo. E não há nada nos dados europeus que indique que o setor privado esteja disposto a carregar o piano em menos de dois anos.
Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, isso é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que tornou grande a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o impulso que a economia precisava.
Mencionei que o Banco Central Europeu – ainda que, felizmente, não a Federal Reserve – parece decidido a piorar ainda mais as coisas aumentando as taxas de juros?
Há uma antiga expressão, atribuída a diferentes pessoas, que sempre me vem à mente quando observo a política pública: “Você não sabe, meu filho, com que pouca sabedoria se governa o mundo”. Agora, essa falta de sabedoria se apresenta plenamente, quando as elites políticas de ambos os lados do Atlântico arruínam a resposta ao trauma econômico fechando os olhos para as lições da história. E a Depressão Menor continua.
Fonte: Sinpermiso
Reprodução: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=18112
Nenhum comentário:
Postar um comentário